Portugal é constitucionalmente uma república democrática, o que significa que todo o poder reside no povo e é exercido em nome do povo.
Dispõe a este propósito o artigo 2º da nossa da Constituição que
“a República Portuguesa é um Estado de Direito Democrático baseado na soberania popular […]”.
E dispõe o artigo 3º, também da Constituição, o seguinte:
“A soberania, una e indivisível, reside no povo que a exerce segundo as formas previstas na Constituição […]”
E como é exercido o poder do povo?
O poder do povo exerce-se através do voto que, com a periodicidade prevista na Constituição exerce tal direito, elegendo ou reelegendo, quem se candidata ao exercício dessas funções, em conformidade com o artigo 10º da Constituição, que diz o seguinte:
“O povo exerce o poder político através do sufrágio universal, igual, direto, secreto e periódico, pelo referendo e das demais formas previstas na Constituição […]”
Todos sabemos que assim se passa com a designação do Presidente da República e da Assembleia da República de qual emerge de forma indireta o Governo.
Não há dúvida nenhuma de que estes órgãos de soberania têm legitimidade democrática.
Mas então, e os Tribunais?
E os Juízes que os corporizam?
Dispõe o artigo 202º da Constituição da República Portuguesa, o seguinte:
“Os Tribunais são órgãos de soberania, com competência para administrar a Justiça em nome do povo.”
Mas o povo não conferiu legitimidade nem poder aos sujeitos que ocupam esses órgãos.
A Constituição diz que exercem o poder jurisdicional em nome do povo, mas o povo não os legitimou com o seu voto, nem direta nem indiretamente.
Esta falta de legitimidade democrática encontra-se mascarada com o disposto no artigo 154, n.º 1 da Lei Organização do Sistema Judiciário que dispõe o seguinte:
“1 - O Conselho Superior da Magistratura é presidido pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e composto ainda pelos seguintes vogais:
a) Dois designados pelo Presidente da República;
b) Sete eleitos pela Assembleia da República;
c) Sete eleitos de entre e por magistrados judiciais.”
Com base nesta lei o Presidente da República designou dois magistrados judiciais para fazerem parte do Conselho.
E a Assembleia da República no uso de igual faculdade designou seis advogados e um magistrado do Ministério Público para fazerem parte do Conselho.
Deste modo, o Conselho Superior da Magistratura ficou com a seguinte composição, que é a atual.
Quer isto dizer que o Conselho Superior de Magistratura é composto na sua esmagadora maioria por Magistrados Judiciais!
Esta regra da maioria do plenário ser composta por magistrados, poderia ser subvertida caso a Assembleia da República e o Presidente da República estivessem impedidos de designar magistrados judiciais como representantes seus do Conselho Superior da Magistratura. Mas tal não acontece.
Foi, pois, o Sr. Presidente da República que conferiu aos Magistrados Judicias a maioria no Conselho Superior da Magistratura.
E embora se deva reconhecer, em abono da verdade, que com expressiva presença obrigatória dos magistrados judiciais no Conselho a presença dos restantes seria pouco mais do que simbólica o certo é que, formando eles a maioria dos membros de tal órgão o dominam por completo.
Não pode deixar de ser acrescentado dois apontamentos, dizendo um respeito ao facto Conselho ser presidido pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e o facto ainda do secretário, embora sem direito de voto ser também obrigatoriamente um magistrado judicial.
O Conselho Superior de Magistratura encontra-se assim completamente esvaziado de autoridade e de poder democrático, fugindo completamente ao escrutínio direto ou indireto do voto popular e permitindo-nos a confusão de que a Magistratura Judicial não está democraticamente legitimada para o exercício da judicatura.
Mas como se isto não bastasse os Magistrados Judiciais dispõe ainda de organismo sindical próprio designado ASJP (Associação Sindical dos Juízes Portugueses), o que lhes permite ter duas faces que se acumulam nas mesmas pessoas e reciprocamente se anulam:
como juízes vestem-se de membros de um órgão de soberania;
mas depois despem a beca e aparecem em público a fazer reclamações de classe como qualquer sindicato, ou seja: descem á qualidade de funcionários judiciais.
Estas incongruências gravíssimas constituem o cerne da crise da justiça cuja critica assumiu foros de um verdadeiro clamor.
A Associação dos Advogados pelas Justiça expôs o assunto ao Sr. Presidente da República, que seguramente por falta de disponibilidade de tempo, delegou no Chefe da sua Casa Civil a audiência pedida pela comissão coordenadora de movimento, (da qual o signatário se afastou).
Foi por isso entregue no Palácio de Belém ao oficial porteiro uma copia da mensagem do movimento, que até hoje não suscitou a menor reação do Sr. Presidente.
O Sr. Presidente da Assembleia da República mandatou um Vice-Presidente para receber a comissão coordenadora, mas não á noticias de qualquer reação, facto que a petição apresentada justificaria.
O Sr. Primeiro Ministro remeteu a exposição á Sr. Ministra da Justiça que também não reagiu.
Quer isto dizer que os órgãos de soberania devidamente legitimados convivem tranquila e comodamente com um “órgão de soberania”, fazendo de contas que este o é: os tribunais! …
Brevemente falaremos sobre a independência dos tribunais!!!
Zérrio
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